Caminhava devagar pela calçada de pedras justapostas, seus pensamentos corriam a mil. Eram tantos compromissos marcados para o dia seguinte que Noêmia temia não cumpri-los.

Tinha a venda de um super imóvel bom na zona sul, pertencente a um proprietário exigente e ganancioso. Haja paciência!

Mas antes deveria ir ao cabeleireiro, hora marcada para não perder tempo. Tinha que pintar a raiz dos cabelos que já gritavam sua idade avançada. Ia aproveitar para depilar as axilas e fazer as unhas. Mulher é assim mesmo – pensava ela.

Lembrou-se de súbito de Leonor, sua vizinha. A coitada perdeu a mãe há pouco tempo e parece que ficou um pouco perdida. Ontem se encontraram por acaso na fila do banco e marcaram para amanhã um bate papo com cafezinho, a moça “precisava conversar um pouco”. E é verdade, ainda tinha que “encaixar” a Leonor no dia de amanhã. Ficou pensando na vizinha que andava macambúzia, sem amigos nem namorado, trabalhando dia e noite naquela loja de antiguidades. Herdou do pai a loja e o compromisso, que ela firmou consigo mesma, “vou manter o negócio da família”. Nunca viajou a coitada, e como viajar com uma loja que abre de domingo a domingo? Meu Deus, como essa moça vai se ajeitar na vida desse jeito? Noêmia estava preocupada com a vizinha, outro dia quando estava indo levar um cliente para ver um casa comercial, a viu bebendo sozinha no Bar do Barba, e lá isso é lugar pra moça de família se enfiar sozinha? Quem sabe a convide para um videokê qualquer noite dessas, pra mim funcionou, foi a música que me tirou da dor de perder meu esposo – pensava Noêmia enquanto tentava encontrar na bolsa o celular que tocava insistentemente.