Está abaixando a poeira quando se aproxima dele uma moça altiva, livro saindo para fora da bolsa, ar faiscante e olhar firme, crescendo até ele. Tem gestos sólidos, pisadas duras e uma casca de gelo: já bem perto vê traços de tristeza e desamparo, talvez solidão. Sem aliança no dedo e sem vida na expressão, o jeito enfurecido era sinal de fumaça ou baixaria, como os anos de agência poderiam contar.
Foi vomitando a culpa do banco, ao que Júlio deixava correr. Mais fácil pensar àquela altura era que todos eles tinham razão. Impaciência de cliente era dose diária na carreira e um prego na cruz. Mas a moça tinha a sua beleza: mantinha o queixo erguido embora a alma estivesse notadamente combalida. Falava grosso com sua voz fina, dava indícios de plantar granadas da bolsa ou pisotear o velhinho que se adiantava à ela na fila. Cercado de regras, burocracia e seguranças, Júlio por um instante considerou atrevimento o que ela foi capaz de lhe dizer, sendo o maior responsável pela agência.
– Não. O senhor vai me atender agora, porque eu estou tentando resolver esse problema há um bom tempo! E como o assunto é de cobranças indevidas, creio que a situação pode ficar bem ruim para o senhor.
Júlio sorri. Ofereceu assento e cafezinho para a moça, talvez uma água gelada. Olhou-a com ternura; talvez estivesse perdida no mundo, ladrando feroz como poodle de madame. Seu instinto masculino se acendeu, mais viril que paternal, mais traste que humano e mais adúltero que bom marido, o que o retrato sobre a mesa desmentia. Mal desse uma entrada e Júlio se disporia a uma cantada leve e rasteira que o seu diabinho lhe soprava na orelha. E olhava a moça de longe, enquanto atendia o velhinho da fila.
E a moça esperando, bufando. E lendo. Arrancara da bolsa qualquer coisa que mal poderia compreender. Mais olhava para os lados, balançava a cabeça, movia pés e mãos em frenesi. Eram indícios de baixaria, que Júlio também pensava em contornar. Até que ela se levanta. Decidida, de livro em punho, bolsa armada, antes que pudesse atendê-la.
– Senhor – disse, aguardando o desvio de atenção que ele dispensava ao atendimento de outra cliente – creio que o péssimo atendimento dessa agência me obriga a recorrer a outros meios para solucionar meu problema. Passe bem.