Trafegando conforto pela larga avenida, recostado ao carro possante e luxuoso, sob um Beethoven incisivo, nem se importou com os costumeiros engarrafamentos da metrópole. Os sinais vermelhos eram preferíveis para que apoiasse sobre o punho cerrado o queixo pensativo. E até se perdia quando abriam os faróis, levando duas ou três buzinadas de graça. Enfiado ainda no dia de trabalho, era capaz de voltar todo o percurso para casa sem quase noção de tempo. E chegava quase duas horas depois, sem notar a noite, a fome, a esposa e os filhos. Não bastava que não os notassem: exceto a noite, o resto era ausência. Os imbróglios na agência bancária embrulhavam-lhe o estômago, a carreira da esposa emplacava a ponto de tomar-lhe o tempo de mãe e as crianças já eram adultas. Restava-lhe enfiar a maleta sobre a cadeira e se esparramar cama abaixo sem paradas. Desafrouxa a gravata, arranca paletó e camisa do tronco que cuidava nas piscinas, arranca os sapatos com os pés, as meias com as mãos e deixa cair calças e cinto de uma vez, desabando sobre os lençóis limpos que a empregada deixara dobrado. O perfume da lavanda nos travesseiros dispara no homem a lembrança do suor impregnado no rosto e acha que precisa de um banho para evitar confronto com a mulher. Não tem forças para levantar, mas a consciência fica rodeando, indo e vindo e não consegue dormir como pretende. Os olhos ardem e não sabe do que: se da fuligem do dia, do cansaço no trabalho ou do sono arrebatado. Vai-se rabugento para o chuveiro como se a mulher o mandasse, abre mais a água fria que a quente, esfrega o corpo nervoso e nem se demora para vestir qualquer short de seda que encontra pela frente, vencido por um quê de calor ou nervoso que não sabe explicar. Volta para o mesmo lugar, o mesmo lençol, a mesma lavanda e finalmente se sente desimpedido para o descanso dos justos.
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Um comentário:
Siempre me es gratificante recorrer el mundo de los blogs… y encontrar algunos como el tuyo. También tengo la esperanza que alguna vez pueda verte por el mío, que también se escribe en portugués, sería como compartir esta pasión por escribir que une a tantas personas y en tantos lugares...
Sergio
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