Um de seus “affairs” nesses anos foi um livreiro descasado dono de uma rede de livrarias na cidade. Nesse período Noêmia deixou de lado a vizinhança para se dar ao luxo de namorar na casa de praia de Leo no litoral norte. Iam quase todos os finais de semanas para o refúgio. E assim o relacionamento intenso durou um ano inteiro. Foi durante esse namoro que ela desenvolveu gosto pela leitura especialmente de suspense policial e estudou por correspondência “métodos e meios de se desvendar crimes”. Leo era cavalheiro, romântico e rico, o que despertava curiosidade em outras mulheres, e um ciúme desconfortável que Noêmia fazia questão de esconder. Ele também cantava na noite para ter seu momento de fama, como dizia, e ria quando falava. Admirava Noemix de voz rouca e gestos eloqüentes e acabou se apaixonando pela mulher que a representava. Tinham muito em comum, gostavam de viajar, ler, dançar, da mesma marca de bebida, do mesmo perfume, tinham hábitos bem parecidos e a mesma paixão pelo canto, ele também era apreciador de romances policiais e discutiam literatura enquanto, entre um copo de cerveja e outro, se bronzeavam ao sol de Ubatuba.
Numa dessas tardes ensolaradas enquanto dividiam a mesma esteira na areia quente, com os corpos besuntados, Leo perguntou se ela queria se casar com ele. Ela estremeceu. Não estava bem certa de ter ouvido direito e perguntou:
— O que disse? – virando seu corpo para o companheiro.
— Você se casaria comigo Noêmia? – insistiu Leo.
Ela não queria, apesar de gostar muito dele. Nunca teve filhos e Leo também não tinha. Isso pesava negativamente para a mulher. “Não” respondeu ela. Não acredito que seríamos tão felizes casados não seriamos felizes assim como somos agora. Faltam-nos filhos disse ela. Ele pousou o copo na areia e se levantou:
— Não tenho mais tempo para ouvir “nãos” Noemia, tenho quase sessenta anos e preciso resolver minha vida – disse oferecendo sua mão para ajudá-la a levantar-se.
Ela sabia que seria o fim, mas nada pode fazer para manter o namoro. Na semana seguinte recebeu um ramalhete de rosas brancas e um cartão: “Siga em paz com amor no coração e brilho nos olhos”, e um “Leo” assinado com letras extravagantes sobre um negro traço e um enorme “ponto final”. Leu e releu aquele cartão tantas vezes, enquanto as rosas ainda viviam no vaso importado na sala de estar. Mas foi a música que a trouxe de volta ao convívio de outras pessoas e ela se recompôs. Tornou-se estudiosa das maledicências da vida, do lado psicológico de criminosos e meios que se utilizavam para cometer crimes de todos os tipos.
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